UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta [...]

(Autor: Fernando Pessoa)

  

  

 

 


 

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Amigo!


Quando se tem um amigo
Um amigo de verdade
Todos os problemas que o outro tem
Passa a ser teu também

Se ele sorri
Voce sorri

Se ele chora
Voce chora

Amigos ficam
Não vão embora

Mesmo se há distância
A amizade não se acaba

Quando se tem um amigo de verdade
A amizade fica, e jamais se apaga...


(Autor Desconhecido)

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Dicas para uma leitura aproveitável


Grande parte de nossa evolução depende diretamente do que ouvimos e principalmente do que aprendemos através das leituras. Um livro, um texto, um jornal se constituem, no mínimo, para elevar-nos intelectualmente e espiritualmente. Ainda que se considere que as pessoas lêem sem terem sido para isso preparadas ou treinadas, assim, como contribuição faço estas anotações para que certamente vão levar mais qualidade e bons resultados ao ato de ler.

1. Exercite o hábito da leitura, para ela se tornar um recurso diário e natural;
2. Leia sempre, mais e melhor. Desde jornais, livros, informativos;
3. Comece pesquisando os próprios livros que estão esquecidos nas prateleiras, e que por qualquer razão ainda não encontrou um tempinho para manusear;
4. Lembre-se de fazê-los circular entre as pessoas de seu círculo de amizade, assim você levará oportunidade para muitos;
5. Tempo para ler existe. É só querer!
6. Importante o estado orgânico de quem lê. Torna-se difícil um bom aproveitamento quando temos um mau estar físico, por exemplo, dor de cabeça;
7. As melhores horas para se ler são as horas da manhã, quando o cérebro está mais descansado, ou no entardecer, após um banho, que nos causa um alívio físico e espiritual das atribulações diárias;
8. Faça marcações nas páginas, sublinhando textos importantes, frases, anote ao lado na margem: importante;
9. Não se preocupe muito com a beleza do compêndio. Quando mais você puder participar, dissecando, retaliando, anotando, é bem melhor, tanto para quem lê, como para quem tenha acesso àquela obra;
10. Frequente sempre que puder feiras de livros, pois se constituem em ótima oportunidade para se presentear alguém, lembrando mais uma vez de presentear a pessoa certa com o livro certo. Nunca esqueça da dedicatória.

Simplesmente ler


Leia vagarosamente, brincando com as palavras, sem querer chegar ao fim, como se estivesse fazendo amor com a pessoa amada.

A leitura nos leva por mundos que nunca existiram e nem existirão, por espaços longínquos que nunca visitaremos.

É desse mundo diferente, estranho ao nosso, que passamos a ver o mundo em que vivemos de uma outra forma.

(Autor: Rubem Alves)

Perfil do Educador!

Gifs e Músicas para Orkut

Capacidades de trabalho a serem valorizadas por todos os profissionais que estão na área de educação:

1. Ter equilíbrio pessoal e experiência anterior.
2. Identificar-se com o projeto político-pedagógico da escola, tanto na estrutura de funcionamento quanto na cultura organizacional.
3. Ter projeto pessoal de auto-formação profissional.
4. Ter capacidade de trabalho em equipe.
5. Ter capacidade de construir uma relação de qualidade com os alunos.
6. Ter capacidade de gerenciar a sala de aula, garantindo um clima propício à aprendizagem, ter fortes compromissos com as dificuldades dos alunos e desenvolver empatia com a faixa etária.
7. Estabelecer vínculos afetivos e de trabalho, buscando coerência entre o discurso e a prática.
8. Saber ensinar de modo coerente, de acordo com a demanda da instituição: ter carisma pessoal comunicar-se com clareza, demonstrar preocupação com as questões educacionais, saber agrupar os alunos, interagir com as características do grupo-classe e favorecer a produtividade entre eles.
9. Manter seus compromissos funcionais, como: assiduidade, pontualidade, compromisso com os prazos de tarefas, disponibilidade de tempo para reuniões, disposição para documentar seus trabalhos, saber elaborar planos de estudo e relatórios.
10. Ser cordial com os pais dos alunos e manter uma parceria constante, visando ao melhor desenvolvimento do aluno.

SE VOCÊ TEM E DISPÕE DAS CARACTERÍSTICAS CITADAS NOS ITENS ACIMA, PARABÉNS, VOCÊ É UM PROFESSOR QUE TODO ALUNO GOSTARIA DE TER! SUA VIDA PROFISSIONAL SERÁ DE MUITO SUCESSO!

Eu não sou você... Você não é eu!


Eu não sou você
Você não é eu
Mas sei muito de mim
Vivendo com você
E você, sabe muito de você vivendo comigo?
Eu não sou você.
Você não é eu.
Mas encontrei comigo e me vi
Enquanto olhava pra você.
Na sua, minha, insegurança
Na sua, minha, desconfiança
Na sua, minha competição
Na sua, minha, birra infantil
Na sua, minha, omissão
Na sua, minha, firmeza
Na sua, minha, impaciência
Na sua, minha, prepotência
Na sua, minha, fragilidade doce
Na sua, minha, mudez aterrorizada
E você se encontrou e se viu, enquanto olhava para mim?
Eu não sou você
Você não é eu
Mas foi vivendo minha solidão
que conversei com você
E você conversou comigo na sua solidão ou fugiu dela, de mim e de você?
Eu não sou você
Você não é eu
Mas sou mais eu, quando consigo
lhe ver, porque você me reflete
No que eu ainda sou
No que quero vir a ser...
Eu não sou você
Você não é eu
Mas somos um grupo, enquanto somos capazes de, diferenciadamente,
eu ser eu, vivendo com você e
Você ser você, vivendo comigo.

(Autora: Madalena Freire)

Homenagem às escolas que são asas...


Escolas que são gaiolas existem para que os
pássaros desaprendam a arte do vôo.
Pássaros engaiolados são pássaros sob controle.
Engaiolados, o seu dono pode levá-las para onde quiser.
Pássaros engaiolados sempre têm um dono.
Deixaram de ser pássaros.
Porque a essência dos pássaros é o vôo.

Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados.
O que elas amam são os pássaros em vôo.
Existem para dar aos pássaros coragem para voar.
Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer,
porque o vôo já nasce dentro dos pássaros.
O vôo não pode ser ensinado.
Só pode ser encorajado.

(Autor: Rubem Alves)

28 de Abril - Dia da Educação!


A principal meta da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, não simplesmente repetir o que outras gerações já fizeram. Homens que sejam criadores, inventores, descobridores. A segunda meta da educação é formar mentes que estejam em condições de criticar, verificar e não aceitar tudo que a elas se propõe.

Autor: Jean Piaget

segunda-feira, 27 de abril de 2009

LIVRO: Arqueologia do Saber - Título original: L' Archéologie du Savoir


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Michel Foucault

Este livro tem como objetivo analisar e apresentar certa modalidade de análise do discurso proposto por Michael Foucault, como um meio capaz de articular os projetos arqueológico e genealógico. Esta perspectiva permite indagar os dois momentos da filosofia foucaultiana não como períodos independentes, em que um se coloca em termos de oposição ou de superação ao anterior, senão que, pelo contrário, mostrar como dois empreendimentos que se complementam. Para realizar essa tarefa pretende-se investigar a trajetória de configuração da análise arqueológica, evidenciando que este projeto de Foucault constitui um instrumento alternativo em relação as concepções antropológicas da modernidade. Na descrição da arqueologia, primeiro desenvolve-se seu afastamento em relação a abordagem epistemológica, depois apresenta-se a análise do discurso como fundamental para compreender a descontinuidade que compõe as ordens dos saberes. Por fim, compreende-se que o empreendimento genealógico deve ser entendido como uma proposta de análise que faz aparecer o que já estava presente na arqueologia, mas que ainda não havia surgido como um domínio específico de análise: as relações de poder. Foucault declara na obra Microfísica do Poder (1979) que embora não tenha usado a palavra poder como um campo de análise nas obras anteriores a 1968, ele estava presente no saber. Desta afirmação pode-se inferir que os movimentos do pensamento de Foucault não implicam uma divisão estática entre uma fase onde predomina o saber (arqueologia) e outra onde predomina o poder (genealógica). O que une e diferencia suas análises não é o objeto a que se referem, mas, antes, o domínio em que se situam. Enquanto a arqueologia pretende descrever o discurso para revelar como o saber nele aparece regulado; a genealogia quer mostrar como nas práticas discursivas há uma relação saber-poder que permite o exercício do poder. Deste modo, a descrição arqueológica da regularidade dos discursos permite a genealogia localizar os pontos de luta em que o intelectual deve exercer sua crítica. Para Foucault o discurso apresenta-se como uma realidade complexa e que, por tanto, é preciso analisá-lo em diferentes níveis. Por um lado, o discurso aparece como um conjunto regulado; por outro lado, mostra-se polêmico e estratégico. Assim, a crítica que arqueologia e genealogia fazem a concepção moderna do sujeito constituinte só pode realizar-se onde o saber e o poder vêm se alojar: no discurso. Enfim, demonstra-se que tanto a arqueologia quanto a genealogia fazem parte da proposta de Foucault de fazer da filosofia uma tarefa crítica do presente através da problematização do pensamento como um acontecimento.

domingo, 26 de abril de 2009

LIVRO: Esperando por Godot - Título original: Waiting for Godot


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Samuel Beckett

Nesta peça do dramaturgo irlandês Samuel Beckett, os personagens se põe a dialogar sobre banalidades enquanto esperam inutilmente uma figura que nunca chega, o Godot do título. Nesses diálogos, sente-se toda a solidão e desolação do ser humano atirado num mundo onde, como dizia Sartre, não há nada de inteligível no céu. Os personagens tentam comunicar-se, há um esforço enorme de entendimento e compreensão, mas a comunicabilidade, para os personagens beckettianos, é algo inacessível. O desespero dos personagens em comunicar o vazio e em esperar o nada é a denúncia que faz Beckett do absurdo da existência humana; luta-se para preencher a vacuidade. Em dado momento, há gritos e gemidos loucamente ininteligíveis; são como uma espécie de vagido do “teatro do absurdo”, como chamaram esse tipo de experiência teatral, que parece buscar e ensaiar uma caça aos limites da palavra, aos abismos do insondável e do que o ser humano tem de mais superficial e sórdido. Desse lama, tenta-se tecer uma poética da incomunicabilidade. A pobreza do enredo, onde as coisas não acontecem entre os personagens, revolucionou o teatro de seu tempo, reduzindo o espetáculo e dando origens às peças pocket de nossa época. A proposta parece desejar reduzir a cenografia ao mínimo para maximizar a rudeza do sofrimento, a imensidade da solidão e a intensidade do drama. Na época em que a peça foi lançada, muitos julgaram que Godot era um símbolo de Deus, e viu-se na palavra “God” um jogo intencional com esse significante. Hoje pode-se dizer que há um livre deslizar de significantes nessa peça, talvez muito longe do significado mítico-religioso que parte da crítica quis dar a essa peça.

LIVRO: Fortaleza Digital - Título original: Digital Fortress


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Dan Brown

O livro conta a história de uma Criptógrafa (Susan) e seu namorado Professor (David). Susan trabalhava na NSA (Agencia de Segurança Nacional), que construiu um supercomputador (TRANSLTR) capaz de decodificar qualquer mensagem criptografada, porem este computador é mantido em segredo e opera de maneira independente (acima de qualquer legislação). Um funcionário da NSA (Ensei Tankado), não concordando com a construção dessa máquina se demite da NSA.
Ensei tankado cria um novo algoritmo de criptografia com cadeia de caracteres mutantes (Fortaleza Digital), segundo ele, esse novo algoritmo era inquebrável, e nem o TRANSLTR seria capaz de decifrá-lo, e coloca uma versão na internet para todos fazerem download. Susan e David estava de viagem marcada para Smoky Mountains tirar férias, quando David desmarcara com urgência a viagem, alegando uma viagem que teria que fazer para a Espanha com urgência. Num domingo Susan recebe a ligação de seu Chefe Strathmore, solicitando que ela se apresenta-se ao complexo da criptografia dentro da NSA. Cegando lá Strathmore, falou para Susan sobre o Fortaleza Digital e disse que o TRANSLTR estava a rodar o arquivo há 16 horas e não chegara a nenhum resultado. Para fazer rodar o arquivo Strathmore teve que desabilitar uma proteção do TRANSLTR para evitar que o computador examinasse arquivos com vírus.
David chegando a Sevilha (Espanha) descobre que Tankado estava morto e por ordens de Strathmore, tem que ir até o necrotério em busca de uma suposta chave que destravaria o Fortaleza Digital – pois o Fortaleza Digital foi criptografado com seu próprio algoritmo de criptografia, para Tankado vender em um leilão. Descobrindo que Tankado estava morto, David falou com o Guarda que resgatou Tankado e pediu onde estaria os seus pertences, o guarda isse que estavam todos com ele, David viu uma marca de anel na mão de Tankado e deu falta de um anel, David pediu para o guarda se alguém mais tinha visto o Tankado, o guarda disse um senhor que estava no hospital.
No Nodo três da criptografia estava deserto estava somente Susan, Strathmore, Hale e Phil. Phil desconfiou que estivesse alguma coisa errada com o TRANSLTR pois estava a 16 horas a rodar o mesmo arquivo, desconfiava que era um vírus, Phil foi tentar desligar o TRANSLTR manualmente, mas entrou em uma briga com Strathmore e caiu sobre uns geradores, morrendo na hora, mas Strathmore não viu que Hale estava escondido e presenciou tudo.Hale voltou para o Domo 3 e tentou contar a Susan o ocorrido, Susan não acreditou e Strathmore amarrou Hale.
David foi até o hospital atrás desse senhor, para saber mais informações, o senhor disse que não estava com o anel e disse que um casal (um gordo e uma ruiva) pegou o anel. No que David saiu do Hospital o senhor foi assassinado. David descobriu o paradeiro da mulher e do homem gordo e foram falar com eles, eles estavam em um hotel, disseram que tinham dado o anel para uma moça com o cabelo pintado de três cores diferentes. David foi atrás dessa moça e logo depois que saiu do hotel o casal foi assassinado.
David achou a moça em aeroporto tentando embarcar para ir embora para sua cidade, David pediu sobre o anel, ela queria um dinheiro para pegar o vôo pois estava sem dinheiro, ela foi no banheiro, David a seguiu e viu a moça morta – era Hulohot enviado por Strathmore, para recuperar o anel, era um mercenário – Hulohot, começou a seguir David até que chegaram em uma igreja, subiu em uma torre e conseguiu matar Hulohot. Nisso Strathmore descobriu que o Fortaleza Digital não era um algoritmo de criptografia e sim um vírus, o TRANSLTR começou a superaquecer e Strathmore deveria desligar ele sob o risco de explodir. Susan resolver descer para desligar o supercomputador manualmente, no caminho da decida escutou um tiro, resolver voltar e encontrou Hale morto com um tiro na cabeça, fora Strathmore. Nisso Strathmore desceu para desligar o TRANSLTR, mas deixou um pager no bolso de seu casaco, e esse pager emitiu um bib, Susan desconfiada pegou e viu a mensagem – Alvo: David Backer /Eliminado – Hulohut se precipitou e mandou a mensagem antes de terminar o serviço. Susan começou a olhar as outras mensagens e vira as mensagens de todas as pessoas mortas e descobrira a verdade. Nisso Strathmore tinha desligado o supercomputador e religado ele, e retornará para a sala e vira Susan com o Pager na mão, e viu que Susan descobriu a verdade. Strathmore disse que a amava, e escutou um forte estrondo era o TRANSLTR com superaquecimento, Strathmore voltou para baixo mas era tarde toda a estrutura explodiu matando ele. Susan conseguiu fugir por um elevador privativo de Strathmore.
Na Espanha depois de David ter matado Hulohot, David foi atingido por um dardo com tranqüilizante e levado para dentro de uma van (Era o pessoal da NSA enviado pelo Fontaine, um chefão da NSA). Na NSA, quando Susan conseguiu fugir pelo elevador encontrou Fontaine e eles foram para uma área secreta onde ficava o banco de dados da NSA. Lá dentro estava um caos, pois o vírus que fora colocado dentro do TRANSLTR, era para atingir o banco de dados e liberar todos os acessos pela internet, o banco de dados continham quatro camadas de firewall, e o vírus estava a destruir uma a uma. A única maneira de parar era inserir a chave. Nisso Fontaine chama a equipe que enviou para a Espanha e eles fazem um vídeo conferência, e aparece a imagem de David, Susan fica muito feliz em ver seu amor vivo – pois achou ele estaria morto. David mostra o anel, mas o anel não tem chave nenhuma. Ensei Tankado, não queria que todo mundo tivesse acesso as informações sigilosas da NSA, mas queria que eles divulgassem para a imprensa a existência do TRANSLTR, nisso antes de morrer Tankado fez um sinal com sua mão mostrando o número 3, assim eles descobriram que essa era a chave. Digitaram a chave, o vírus parou seu efeito, o firewall se recuperou, e todos viveram felizes para sempre.

LIVRO: O Segredo - Título original: The Secret


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Rhonda Byrne

Parte da idéia da lei de atração, presente em todo o universo, depende de quem Se utiliza dela conseguir alcançar o que pretende.
Desta forma a culpa pelas coisas ruins que nos acontecem ao longo da vida é de cada um que guia seu destino.
A forma de se atrair as coisas que homens e mulheres mais querem no mundo como saúde, dinheiro e fama, concentrarem-se no que se quer independente se o objeto de nosso desejo é um bem material ou a materialização de um amor, a felicidade, a saúde.
Para tanto primeiramente, deve-se pensar e traçar o que se quer de forma mental e depois escrita, visualizando sempre que possível o objeto de nosso desejo, como se este já fizesse parte de nossas vidas.
O tempo que este evento leva para acontecer depende do empenho com que se faz a mentalização.
Erro fatal demonstrado é concentrar-se em situações negativas, como o caso das dívidas, pois quanto mais se pensa nelas, no saldo negativo no banco, na perda de um amor na doença, mais dela de atrai.
Devemos antes de nos concentrarmos no que desejamos agradecermos o que temos de bom em nossas vidas, a presença de um ser amado, um animal de estimação ou qualquer coisa que nos dê prazer, após realizar a mentalização do que se pretende conquistar e deixar que o universo se encarregue de realizar o resto.
É colocado no filme que diversas mentes brilhantes sabiam do segredo, ainda conta com depoimentos pessoais onde é possível observar o segredo em sua evolução.
Vale lembrar que esta mesma teoria em certa medida é compartilhada com Capra.

LIVRO: Vigiar e Punir - Título original: Surveiller et Punir (naissance de La Prison)


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Michel Foucault

A punição e a vigilância são poderes destinados a educar (adestrar) as pessoas para que essas cumpram normas, leis e exercícios de acordo com a vontade de quem detêm o poder. A vigilância é uma maneira de se observar à pessoa, se esta está realmente cumprindo com todos seus deveres – é um poder que atinge os corpos dos indivíduos, seus gestos, seus discursos, suas atividades, sua aprendizagem, sua vida cotidiana.
A vigilância tem como função evitar que algo contrário ao poder aconteça e busca regulamentar a vida das pessoas para que estas exerçam suas atividades. Já a punição é o meio encontrado pelo poder para tentar corrigir as pessoas que infligem as regras ditadas pelo poder e ela também é o meio ilidir que essas pessoas cometam condutas puníveis (através da punição as pessoas terão receio de cometer algo contrário às normas do poder). A vigilância e a punição podem ser encontradas em várias entidades estatais, como hospitais, prisões e escolas. Foi criado até um sistema chamado panóptico para facilitar nessa vigilância, nesse sistema haveria uma torre central a qual avistaria, vigiaria todos de uma só vez que estão a sua volta já que essa estrutura a volta da torre central era circular. “O panóptico de Jeremy Bentham é uma composição arquitetônica de cunho coercitivo e disciplinatório: possui o formato de um anel onde fica a construção à periferia, dividida em celas tendo ao centro uma torre com duas vastas janelas que se abrem ao seu interior e outra única para o exterior permitindo que a luz atravesse a cela de lado...” (Michel Foucault - Micro-Física do Poder). A relação entre vigiar e punir está no fato de que com ela seria possível “adestrar” as pessoas para que estas exercessem suas tarefas como bons cidadãos, evitar o máximo que as pessoas infringissem as normas estabelecidas pelo poder, estas idéias podem ser retiradas do livro Vigiar e Punir. Segundo Foucault para economia do poder seria mais rentável e mais eficaz vigiar do que punir. Isso pode ser facilmente observado se pegarmos o panoptismo como exemplo, pois é muito mais barato vigiarmos as pessoas para que estas não infrinjam as leis, do que posteriormente puni-las, pois na punição terá que ser gasto muito dinheiro para que a pessoa que infringiu a lei seja resociabilizada (reeducado). Além disso, com o sistema panóptico a vigilância fica ainda mais fácil, já que é possível vigiar várias pessoas ao mesmo tempo e com a punição para que esta alcance mesmo seu objetivo ela tem que ser aplicada de maneira individual – pois cada um tem uma maneira diferente de serem reeducado e resociabilizado. Ainda podemos dizer que a vigilância ganhou espaço na economia do poder, pois é muito mais fácil vigiar as pessoas para ver se estas estão mesmo cumprindo suas funções, e com o panoptismo isso fica ainda mais fácil principalmente nas entidades como nos hospitais e nas escolas, do que vir a puni-las caso cometam algum erro.

LIVRO: Microfísica do Poder - Título original: Microphysique du Pouvoir


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Michel Foucault

O conceito de poder é central dentro da obra de Michel Foucault. Para o autor, o poder não é algo que se possa possuir. Portanto, não existe em nenhuma sociedade divisão entre os que têm e os que não têm poder. Pode-se dizer que poder se exerce ou se pratica. O poder, segundo Foucault, não existe. O que há são relações, práticas de poder. O poder circula. Para Foucault, ao contrário das teses althusserianas - segundo as quais todo poder emana do Estado para os Aparelhos Ideológicos - há as chamadas micropráticas do poder. “De modo geral, penso que é preciso ver como as grandes estratégias de poder se incrustam, encontram suas condições de exercício em micro-relações de poder. Mas sempre há também movimentos de retorno, que fazem com que estratégias que coordenam as relações de poder produzam efeitos novos e avancem sobre domínios que, até o momento, não estavam concernidos.” O tema, no seu desenvolvimento, é retirado do exclusivo campo político para ser instalado no cotidiano. Sem deixar de reconhecer que os interesses hegemônicos de diferentes grupos sociais se encontram por trás de situações de poder generalizadas, considera-se que não é a única manifestação do poder propriamente dito. O poder é, em essência, uma personagem que atravessa todos os cenários da vida humana. “Quero dizer o seguinte: a idéia de que existe, em um determinado lugar, ou emanando de um determinado ponto, algo que é um poder, me parece baseada em uma análise de enganosa e que, em todo caso, não dá conta de um número considerável de fenômenos. Na realidade, o poder é um feixe de relações mais ou menos organizado, mais ou menos piramidalizado, mais ou menos coordenado. (…) Mas se o poder na realidade é um feixe aberto, mais ou menos coordenado (e sem dúvida mal coordenado) de relações, então o único problema é munir-se de princípios de análise que permitam uma analítica das relações do poder.” Sua natureza final não pode ser apreendida senão ali onde sua intenção está totalmente investida: no interior de práticas reais e efetivas e na relação direta com seu campo de aplicação. Resulta lógico então não tomar o nível macro como ponto de partida para sua análise, sem a multiplicidade de atos que diariamente são protagonizados pelo indivíduo. Não é algo que se precipita sobre o indivíduo e que se encontra institucionalizado nas formações sociais. Não importa a legitimidade do mesmo se emana dos interesses do grupo hegemônico ou se é produto da vontade da maioria. A idéia é que o poder se gera e materializa em uma gama extensa de relações pessoais desde as quais se leva a constituir estruturas impessoais. Se ao analisar o discurso existem normas que regem nossa percepção, devem existir, por sua vez, mecanismos que possibilitem que se estruturem e se reproduzam. Não se pode deixar de reconhecer a presença de pelo menos dois grandes planos em que se agrupam as diferentes manifestações de poder tomando como critério a extensão das mesmas. Uma estaria constituída pelas relações interpessoais, que não alcançam a totalidade de integrantes de um grupo e outra está caracterizada por formas institucionalizadas que operam como espaços fechados. Nesses casos, já não é poder de um indivíduo sobre outro, mas de um grupo sobre outro, com as características que seus integrantes queiram ou não, ficam presas no seu exercício. Os dois planos têm dinâmicas diferentes e geram formas de perpetuação e defesa diferentes. Foucault parte do princípio de que existem duas esferas em que se consolidam as práticas, cada uma delas tem seus próprios mecanismos de legitimação, atuam como “centros” de poder e elaboram seu discurso e sua legitimidade. Uma das ditas esferas está constituída pela ciência. A outra, pelo contrário, está formada por todos os demais elementos que podem ser definidos como integrantes da cultura. O ideológico, as diferenciações de gênero, as práticas discriminatórias, as normas e os critérios de normalidade estão dentro da segunda esfera. Tanto uma quanto a outra com uma referência notória a um tempo e espaço determinado. Utilizado a genealogia do sistema, Foucault chega à conclusão de que a instauração da sociedade moderna supôs uma transformação na consagração de novos instrumentos pelos quais se pode canalizar o poder. De forma paralela se construiu um conjunto extenso de discursos que conferiram força e capacidade de expandir-se a essas novas formas de poder. Estas já não se baseiam como no passado, na força e sua legitimação religiosa. Dado que como afirma o homem, em sua atual dimensão é uma criação recente, o poder deve materializar-se por meio de diferentes formas de disciplina. É necessário que passe a integrar parte do próprio ser de cada indivíduo. O dominado deve considerar natural ser subjugado. O poder produz o real. Por possuir essa eficácia produtiva, o poder volta-se para o corpo do indivíduo, não com a intenção de reprimi-lo, mas de adestrá-lo. No entanto, todo poder pressupõe resistência. O poder não está em uma pista de mão única. Para alcançar essa meta deve-se estruturar uma retícula de poderes entrecruzados que vão, no seu caminho, conformando os indivíduos. O poder não tem uma única fonte nem uma única manifestação. Tem, pelo contrário, uma extensa gama de formas. Quando um grupo social é capaz de apoderar-se dos mecanismos que regulam determinada manifestação a põe a seu serviço e elabora uma estrutura que se aplica a potenciais dominados. Cria-se, assim, um discurso que se apresenta como “natural” e procura bloquear as possibilidades de aparição de outros discursos que tenham capacidade questionadora. Essa necessidade de se contar com um discurso de respaldo, com uma determinada forma de verdade, leva necessariamente a estabelecer uma relação entre poder e saber.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Amei-te


Amei-te e por te amar só a ti eu não via...
Eras o céu e o mar, eras a noite e o dia...
Só quando te perdi é que eu te conheci...

Quando te tinha diante do meu olhar submerso
Não eras minha amante... Eras o Universo...
Agora que te não tenho, és só do teu tamanho.

Estavas-me longe na alma, por isso eu não te via...
Presença em mim tão calma, que eu a não sentia.
Só quando meu ser te perdeu vi que não eras eu.

Hoje eu busco-te e choro por te poder achar
Não sequer te namoro, como te tive a amar...
Nem foste um sonho meu... porque te choro eu?

E hoje pergunto em mim quem foi que amei, beijei
Com quem perdi o fim aos sonhos que sonhei...
Procuro-te e nem vejo o meu próprio desejo...

Que foi real em nós? Que houve em nós de sonho?
De que Nós fomos de que voz o duplo eco risonho
Que unidade tivemos? O que foi que perdemos?

Amamo-nos deveras? Amamo-nos ainda?
Se penso vejo que eras a mesma que és...
E finda tudo o que foi o amor; assim quase sem dor.

Sem dor... Um pasmo vago de ter havido amar...
Quase que me embriago de mal poder pensar...
O que mudou e onde? O que é que em nós se esconde?

Talvez sintas como eu e não saibas senti-lo...
Ser, é ser nosso véu, amar é encobri-o,
Hoje que te deixei é que sei que te amei...

Que importa? Se o que foi entre nós foi amor,
Se por te amar me dói já não te amar, e a dor
Tem um íntimo sentido, nada será perdido...


(Autor: Fernando Pessoa)

Desabafo de uma mulher rebelde...


São 7h. O despertador canta de galo e eu não tenho forças nem para atirá-lo contra a parede.

Estou TÃO acabada, não queria ter que trabalhar hoje. Quero ficar em casa, cozinhando, ouvindo música, cantarolando até. Se tivesse filhos, gastaria a manhã brincando com eles, se tivesse cachorro, passeando pelas redondezas.

Aquário? Olhando os peixinhos nadarem. Espaço? Fazendo alongamento. Leite condensado? Brigadeiro. Tudo menos sair da cama, engatar uma primeira e colocar o cérebro para funcionar.

Gostaria de saber quem foi a mentecapta, a matriz das feministas que teve a infeliz idéia de reivindicar direitos à mulher, e por quê ela fez isso conosco, que nascemos depois dela. Estava tudo tão bom no tempo das nossas avós, elas passavam o dia a bordar, a trocar receitas com as amigas, ensinando-se mutuamente segredos de molhos e temperos, de remédios caseiros, lendo bons livros das bibliotecas dos maridos, decorando a casa, podando árvores, plantando flores, colhendo legumes das hortas, educando crianças, freqüentando saraus... A vida era um grande curso de artesanato, medicina alternativa e culinária. Aí vem uma fulaninha qualquer que não gostava de sutiã, tampouco de espartilho, e contamina várias outras rebeldes inconseqüentes com idéias mirabolantes sobre "vamos conquistar o nosso espaço". Que espaço, minha filha? Você já tinha a casa inteira, o bairro todo, o mundo ao seus pés. Detinha o domínio completo sobre os homens, eles dependiam de você para comer, vestir, e se exibir para os amigos..., que raio de direitos requerer?

Agora eles estão aí, todos confusos, não sabem mais que papéis desempenhar na sociedade, fugindo de nós como o diabo da cruz. Essa brincadeira de vocês acabou é nos enchendo de deveres, isso sim. E nos lançando no calabouço da solteirice aguda.

Antigamente, os casamentos duravam para sempre, tripla jornada era coisa do Bernard do vôlei - e olhe lá, porque naquela época não existia Bernard e, se duvidar, nem vôlei.

Por quê, me digam, por quê um sexo que tinha tudo do bom e do melhor, que só precisava ser frágil, foi se meter a competir com o "macharedo"? Olha o tamanho do bíceps deles, e olha o tamanho do nosso. Tava na cara que isso não ia dar certo. Não agüento mais ser obrigada ao ritual diário de fazer escova, maquiar, passar hidratantes, escolher que roupa vestir, que sapatos, acessórios, que perfume combina com o meu humor, nem de ter que sair correndo, ficar engarrafada, correr risco de ser assaltada, de morrer atropelada, passar o dia ereta na frente do computador, com o telefone no ouvido, resolvendo problemas. Somos fiscalizadas e cobradas por nós mesmas a estar sempre em forma, sem estrias, depiladas, sorridentes, cheirosas, unhas feitas, sem falar no currículo impecável, recheado de mestrados, doutorados, e especializações. Viramos supermulheres, continuamos a ganhar menos do que eles.

Não era muito melhor ter ficado fazendo tricô na cadeira de balanço? Chega!, eu quero alguém que pague as minhas contas, abra a porta para eu passar, puxe a cadeira para eu sentar, me mande flores com cartões cheios de poesia, faça serenatas na minha janela - ai, meu Deus, 7h 30min, tenho que levantar!, - e tem mais, que chegue do trabalho, sente no sofá, coloque os pés para cima e diga: "meu bem, me traz uma dose de whisky, por favor?", descobri que nasci para servir. Vocês pensam que eu estou ironizando? Estou falando sério! Estou abdicando do meu posto de mulher moderna... Troco pelo de Amélia. Alguém se habilita?

(Autor Desconhecido)

Mulheres


Elas sorriem quando querem gritar.
Elas cantam quando querem chorar.
Elas choram quando estão felizes.
E riem quando estão nervosas.
Elas brigam por aquilo que acreditam.
Elas levantam-se para injustiça.
Elas não levam "não" como resposta quando acreditam que existe melhor solução.
Elas andam sem novos sapatos para suas crianças poder tê-los.
Elas vão ao médico com uma amiga assustada.
Elas amam incondicionalmente.
Elas choram quando suas crianças adoecem e se alegram quando suas crianças ganham prêmios.
Elas ficam contentes quando ouvem sobre um aniversário ou um novo casamento.

(Autor: Pablo Neruda)

Gratidão!


A gratidão é uma emoção, que envolve um sentimento de dívida emotiva em direção de outra pessoa; freqüentemente acompanhado por um desejo de agradecê-lo, ou reciprocar para um favor que fizeram por você. A gratidão é a mais agradável das virtudes; não é, no entanto, a mais fácil. Por que seria? Há prazeres difíceis ou raros, que nem por isso são menos agradáveis. Talvez sejam até mais. No caso da gratidão, todavia, a satisfação surpreende menos que a dificuldade. Quem não prefere receber um presente a um tapa? Agradecer a perdoar? A gratidão é um segundo prazer, que prolonga um primeiro, como um eco de alegria à alegria sentida, como uma felicidade a mais para um mais de felicidade. O que há de mais simples? Prazer de receber, alegria de ser alegre: gratidão. O fato de ela ser uma virtude, porém, basta para mostrar que ela não é óbvia, que podemos carecer de gratidão e que, por conseguinte, há mérito – apesar do prazer ou, talvez, por causa dele – em senti-la. Mas por quê? A gratidão é um mistério, não pelo prazer que temos com ela, mas pelo obstáculo que com ela vencemos. É a mais agradável das virtudes, e o mais virtuoso dos prazeres.

(Autor Desconhecido)


Se não puderes ser um pinheiro, no topo de uma colina, sê um arbusto no vale, mas sê o melhor arbusto à margem do regato.
Sê um ramo, se não puderes ser uma árvore.
Se não puderes ser um ramo, sê um pouco de relva e dá alegria a algum caminho.
Se não puderes ser uma estrada,sê apenas uma senda.
Se não puderes ser o Sol, sê uma estrela.
Não é pelo tamanho que terás êxito ou fracasso…
Mas sê o melhor no que quer que sejas.

(Autor: Pablo Neruda)

LIVRO: História da Loucura na Idade Clássica - Título original: Historie de la folie à l'âge classique


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Michel Foucault

Essa tese de doutorado de Michel Foucault não é, como parece indicar o título, uma história da psiquiatria, mas uma história das atitudes de segregação e de exclusão da loucura na Europa ocidental.
A primeira parte da obra analisa o fenômeno do internamento e as diversas significações dessa prática. Foucault mostra que, embora a lepra desapareça do mundo ocidental no fim da Idade Média, sendo sucedida pela loucura, é só depois de mais ou menos dois séculos que esse novo tormento provoca reações de segregação, exclusão, purificação. A loucura só será disciplinada em meados do século XVII, quando o grande confinamento a subtrai à liberdade imaginária que lhe permitia fervilhar ainda sob os céus do Renascimento e a condena ao silêncio.

O classicismo inventou o internamento, mais ou menos como a Idade Média inventara a segregação dos leprosos. Confinam-se os loucos, mas também os pobres, os desocupados, os ociosos, os homossexuais, os libertinos.

Ao anexar ao campo da desrazão, ao lado da loucura, as proibições sexuais, os interditos religiosos, as liberdades de pensamento e sentimento, o período clássico formava “uma experiência moral da desrazão”, que constitui o alicerce de nosso conhecimento “científico” sobre a doença mental.

A segunda parte da obra é dedicada ao problema do reconhecimento e do conhecimento da loucura no período clássico.

Foucault mostra que, se de um lado a loucura é sentida como desrazão – ou seja, como negatividade vazia da razão -, por outro a análise médica vai tentar conferir-lhe uma determinação positiva. Configura-se um grande trabalho de classificação, animado por uma metáfora constante que tem a amplitude e a obstinação do mito: é a transferência das desordens da doença para a ordem da vegetação. É preciso organizar e ordenar as doenças mentais em classes, gêneros e espécies, com o mesmo cuidado e a mesma exatidão com que os botânicos fizeram o Tratado das plantas. O louco encontra-se, assim, no jardim das espécies. Ao mesmo tempo, alguma coisa que logo se transformará em clínica está começando a inaugurar-se. Organizam-se tratamentos voltados para a unidade indissociável de corpo e alma. Procura-se fortificar, vivificar as fibras nervosas, as membranas, todos os elementos do organismo considerados capazes de estabelecer a comunicação entre corpo e alma (uso do ferro, em especial). Sonha-se com a purificação total: uso de mel, fuligem de chaminé, açafrão, tatuzinhos e pó de patas de lagostim como dissolventes de todas as fermentações que, formadas no corpo, determinam a loucura. Apela-se para a imersão: duchas, tratamentos por banhos. Nesses tratamentos, estabelece-se entre o médico e o doente um confronto que vai possibilitar a psiquiatria de observação.

Na terceira parte, Foucault analisa o duplo movimento de libertação e alienação da loucura pela medicina mental moderna. No século XVIII, o pavor diante da desrazão é acompanhado por um medo específico da loucura. Esta é agora percebida como um sinal da precariedade de uma razão que pode vacilar a todo instante. A partir daí, os loucos se apartam, como por iniciativa própria, e ocupam um lugar que lhes pertence propriamente. Aparecem os primeiros asilos, que de início despertam curiosidade, depois compaixão e por fim, no século XIX, o humanitarismo e a solicitude social. É o grande movimento de reforma promovido por Pinel e Tuke: inquérito dos comissários, constituição de grandes hospitais. E logo vem a época de Esquirol e da “ciência” médica da loucura.

Mas se a loucura teve finalmente reconhecidos os seus direitos, foi para ser imediatamente reinserida nas normas sociais da burguesia. Pinel e seus seguidores, em vez de libertarem o louco, tornaram-no definitivamente alienado. A coação física foi substituída pela coerção moral exercida pelo médico. Quanto à ciência psiquiátrica, aboliu qualquer expressão própria da loucura e conferiu ao louco a posição de puro objeto.

Em conclusão, Foucault mostra que a psiquiatria, ao querer domesticar a loucura, na verdade impediu-se de compreendê-la. Esta se manifesta com todo o seu vigor criativo em Nerval, Nietzsche, Van Gogh, Artaud… Ardil e novo triunfo da loucura, que escapa a medidas e justificações por parte da psicologia.

História da loucura consagra uma nova abordagem do poder e da política. Foucault mostra a razão como uma das figuras do poder, que funciona como um modelo de exclusão e permite a dominação do homem pelo homem. Essa obra também teve influências práticas. Contribuiu para acelerar a crise do movimento psiquiátrico e reforçou a posição de antipsiquiatras como Laing e Cooper.

LIVRO: As Palavras e as Coisas - Título original: les Mots et les Choses


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Michel Foucault

O livro As Palavras e as Coisas, do pensador francês Michel Foucault, traça um quadro detalhado da mudança de ordenamento que ocorre no discurso ocidental no período que se estende do Renascimento até o final do século XVIII e início do século XIX (período que o pensador pontua como o tempo de efetivação da ideologia chamada de modernista). Foucault atravessa a História, na tentativa de cercar os elementos de significância que ilustram, a partir de seu entrecruzamento, os jogos de sentido que auxiliaram na reprodução da "epistême" moderna. A construção dos sistemas de articulação científica, sua maneira de ser e todo o enredo discursivo que contribuiu para a disseminação das representações das representações são objeto do trabalho arqueológico do pensador, que surpreende os mais ingênuos com a infância semântica do homem, objeto recente na história do saber. A diferenciação que se cria entre as chamadas "ciências humanas" e aquelas que recebem o rótulo purificado de "ciências exatas" é também analisada nesta obra, que se destaca por enxergar no aparecimento e no desenrolar do humanismo um elemento gerador de crise para o próprio discurso científico como um todo, e mesmo para toda a epistême moderna em todo o seu enquadramento. Michel Foucault inaugura, com As Palavras e as Coisas, uma nova metodologia para se fazer uma investigação de um problema filosófico: a arqueologia dos saberes. O grande fator de ineditismo desta forma de se fazer filosofia consiste na análise dos discursos e práticas das mais diversas áreas do conhecimento – mas de uma forma muito diversa das que se costumam fazer. O paralelismo com a arqueologia tradicional se dá pelo fato de o filósofo “cavoucar” não apenas, mas principalmente, nas entrelinhas destes discursos e práticas – como o arqueólogo escava seus sítios. Depois de garimpados e tendo sido feita a triagem das partes dos discursos e práticas de seus domínios próprios, que logo em seguida são peneirados e separados, e devidamente catalogados pelo filósofo, pode-se passar ao estabelecimento de uma articulação e interrelação entre seus diversos âmbitos de saberes, começando a constituir um cenário único e coeso, a despeito das naturezas várias dos quais se originaram – o que é igualmente semelhante ao trabalho do arqueólogo, quando este faz a triagem dos diversos pedaços de objetos diferentes que recolhe e que, sob um primeiro olhar, não se encontra nenhuma relação entre eles, mas que, a partir de uma análise desses fragmentos diversos, o arqueólogo consegue reconstruir – ou melhor, “reconstituir” ou “intuir” – uma configuração de mundo da qual esses objetos são oriundos. No caso de As Palavras e as Coisas, o que Michel Foucault vai procurar fazer para responder à questão da representação e conformação de saberes é estabelecer a instauração de seus sítios arqueológicos – ou seja, o campo onde vai buscar seus pressupostos e marcos teóricos e, é claro, suas premissas – nos domínios da Biologia (ou melhor, das Ciências Naturais), da Economia e da Linguagem, estabelecendo um intervalo histórico compreendido entre os séculos XV e XIX. Articulando, para este fim, discursos de pensadores proeminentes destas áreas no intervalo citado, como Adam Smith, Cuvier, Lamarck, Marx, entre outros. O texto deixa uma importante conclusão, em termos do processo histórico: para o homem, como sentido e como objeto de estudo, o período que se estende para trás do século XVII é apenas e tão somente uma pré-história, reticências prévias.

LIVRO: Mimesis



Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Erich Auerbach

Como contemporâneo de uma geração que revelou grandes estudiosos alemães-judeus de literaturas, línguas e culturas, o filólogo Erich Auerbach (1892-1957) tornou-se uma das mais significativas referências nos estudos de cunho hermenêutico e de exegese literária do Ocidente. Isso devido, principalmente, após o fato de ter publicado em 1946 sua obra monumental intitulada Mímesis. Os que fazem parte dessa vetusta tradição intelectual podem, pela importância e qualidade dos seus trabalhos, serem aqui elencados de modo irrefutável: a começar pelo sábio prussiano Karl Lachmann (1793-1851) – fundador da nova crítica textual –; os filólogos Friedrich Christian Diez (1794-1876), Ernst Robert Curtius (1820-1885), Karl Vossler (1872-1949) e Leo Spitzer (1887-1960); o glotólogo e romanista Hugo Schuchardt (1842-1927); a exegeta berlinense Carolina Michaëlis de Vasconcelos (1851-1925) e o lingüista neogramático Wilhelm Meyer-Lübke (1861-1936), só para destacarmos os mais expressivos eruditos que marcaram um grande momento do estudo das chamadas Humanidades. Há muito tempo considerado um livro clássico entre os estudiosos das letras, trata-se da obra-prima do sábio berlinense. Mímesis compreende, entre outros e relevantes aspectos, uma abordagem original da questão da representação da realidade e do foco narrativo em obras emblemáticas da literatura ocidental, partindo de textos antigos da cultura greco-latina até contemplar autores da modernidade como os irmãos Jules e Edmond de Goncourt e a novelista e ensaísta britânica Virginia Woolf. De forma excepcional, com Erich Auerbach e seu famoso compêndio, a crítica literária no século XX experimentou enorme avanço quanto à metodologia de análise textual. Isso porque o exegeta germânico soube, como poucos estudiosos da matéria, estabelecer uma fecunda confluência da pesquisa histórica e filológica com a estilística para o esclarecimento da obra literária. Com sua erudição, pôde também desenvolver a necessária e pertinente conexão entre filologia e literatura, o que permitiu enorme avanço qualitativo em suas análises, adotando um método caracterizado pela possibilidade de junção do diacronismo com o sincronismo que, no seu caso, e de forma original – voltamos a destacar – só contribuiu para uma leitura atual e esclarecedora dos grandes textos e excertos da literatura do Ocidente. Tal preocupação se reflete no reconhecimento da importância da edição crítica, numa consistente historiografia da literatura através da adoção de um estilo que aprofunda aspectos filológicos pertinentes ao trabalho de análise de questões de poética e de retórica, indispensáveis para uma maior compreensão dos autores estudados em sua dimensão cultural. Neste tocante, são palavras do próprio sábio berlinense:

A necessidade de construir textos autênticos se faz sentir quando um povo de alta civilização toma consciência dessa civilização e deseja preservar dos estragos do tempo as obras que lhe constituem o patrimônio espiritual. (AUERBACH, 1976, p.12).

Eis, de modo cristalino, sua consciência da urgência e importância do método filológico no esclarecimento do texto e da tradição que o envolve. É bem possível que devamos compreender, mediante tal questionamento, a razão pela qual o autor de Mímesis permaneça gerando profícuos debates entre os que, pertencendo a campos diversificados do conhecimento humanístico, nunca deixaram de se interessar pela sua obra monumental. Malgrado a importância dos trabalhos de Erich Auerbach para o estudo da literatura do Ocidente seja inconteste, no Brasil – em termos gerais – é possível verificar um interesse ainda incipiente pelo conhecimento mais abrangente de sua obra e, de modo especial, por Mímesis. Talvez devido a certas dificuldades técnicas na compreensão dos seus ensaios – (e aqui não podemos desconsiderar dificuldades de tradução, sua enorme erudição e a diversidade de questões envolvidas em seu método de abordagem textual) – não se tenha ainda atingido um grau satisfatório de abordagens que contemplem, de forma regular e freqüente, seu legado intelectual. Principalmente entre as novas gerações acadêmicas. Dada a amplitude da produção de estudos universitários na área de Humanidades em nosso país, não são muitos – nos dias de hoje – os que se interessam por sua obra nas universidades brasileiras. As causas dessa relativa indiferença talvez possam ser explicadas pela ausência de uma tradição, no âmbito de nossas academias, que se volte de modo mais enfático para os estudos no campo da Filologia Românica, com seus métodos de crítica textual em sua feição clássica. A quantidade de estudos a respeito do legado intelectual do sábio berlinense ainda não representa contingente de vulto, necessário a um debate mais consistente e aprofundado sobre sua contribuição à historiografia e sociologia literárias, das relações entre a filologia e a análise do discurso, de aspectos que envolvam línguas e culturas, além da necessidade e urgência de abordagens textuais cujos parâmetros se pautem em edições críticas criteriosas que levem em conta as complexas relações entre língua e representação literária. Considerando o raio de abrangência da disciplina filológica, para a leitura aprofundada de Mímesis torna-se fundamental, pelo menos num primeiro momento, o conhecimento de línguas, estilística, historiografia literária, sociologia da literatura, análise do discurso e de teorias do foco narrativo. Na tentativa de compreensão do moderno método hermenêutico de Erich Auerbach é imprescindível o domínio interdisciplinar do leitor que, ao analisar sua obra modelar, terá que empreender descomunal labor de estudo nas áreas do saber referidas. Obra obrigatória para quem se dedica aos estudos filológicos e estéticos sobre a literatura do Ocidente. Trabalho de erudição e agudeza crítica, escrito no exílio, na Turquia, para escapar ao terror nazista, e que constitui um exemplo da possibilidade de conexão entre a análise diacrônica (fenômenos sociais/artísticos que ocorrem através do tempo) e sincrônica (estuda o sistema sígnico num dado ponto no tempo, sem considerar sua história) e da fecundidade de sua aplicação, para uma leitura atualizada dos grandes textos da criação literária.

LIVRO: De frente para o sol - Título original: Staring at the sun


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Irvin D. Yalom

Por trás das nossas angústias, vive o fantasma da morte. Embora as religiões cumpram o papel de nos oferecer uma resposta para nossa existência, sobre a morte todas as nossas construções são imaginárias. A morte não deve ser temida. De certa forma, somos todos imortais, uma vez que algo de nós se transmite aos que nos rodeiam e aos nossos herdeiros por meio do que Dr. Yalom chama de propagação. Este livro se propõe a ser um guia acessível a todos aqueles – tanto leitores comuns quanto psicoterapeutas – que desejam fazer uma reflexão mais aprofundada sobre os mistérios que para cada um de nós abriga o futuro e o destino.

LIVRO: O Santo e a Porca


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Ariano Suassuna

Eudoro Vicente manda uma carta a Eurico dizendo que lhe pedirá o seu bem mais precioso. Na casa do comerciante, moram a filha Margarida, a irmã de Eurico, Benona, a empregada Caroba e, já há algum tempo, Dodó, filho do rico fazendeiro Eudoro. Dodó vive disfarçado, finge-se de torto, deformado e sovina. Assim conquistou Eurico, que lhe atribuiu a função de de guardião da filha, quem Dodó namora às escondidas. O desenrolar dos fatos se desencadeira com a carta enviada por Pinhão, empregado de Eudoro e noive de Caroba, empregada de Euricão. Eudoro informa que fará uma visita para pedir esse bem tão precioso a Eurico, que fica apreensivo, pois pensa que lhe pedirá dinheiro emprestado. Eurico insiste em de dizer pobre, repetindo as frases: "Ai a crise, ai a carestia". Na sala da casa de Eurico, onde as cenas se desenrolam, há uma estátua de Santo Antônio, de quem Eurico é devoto, e uma antiga porca de madeira, a quem ele dedica especial atenção e que logo o público saberá que esconde maços de dinheiro. Caroba, muito esperta, percebe que Eudoro pedirá Margarida em casamento, é assim que ela entende o bem mais precioso de Eurico que o fazendeiro, pai de Dodó, quer saber. Então ela arma um circo para alcançar alguns objetivos: ganhar algum dinheiro, pois quer casar com Pinhão, casar Dodó e Margarida além de Eudoro e Benona, que já tinham sido noivos há muitos anos. Eudoro, viúvo, querias Margarida, mocinha; Benona, solteirona, queria Eudoro, fazendeiro; Margarida queria Dodó, pois o amava; Caroba e Pinhão se queriam; Euricão queria a porca, ou será que queria a proteção de Santo Antônio para a porca? Caroba negocia uma comissão com Eurico para ajudá-lo a tirar vinte contos de Eudoro Vicente, antes que este peça dinheiro a Eurico. Acertam-se. Aí Caroba convence Benona que Eudoro virá pedi-la em casamento e se dispõe a ajudá-la. São então tramas de Caroba: fazer Eurico pedir vinte contos a Eudoro para o casamento (na realidade, para um jantar); convencer Benona de que Eudoro viria pedi-la em casamento; fazer Eudoro acreditar que pede Margarida; fazer Eurico crer que Eudoro pede Benona; armar um encontro entre Eudoro e Margarida na penumbra; ficar no lugar de Margarida, com o vestido dela. Conseqüências das armações de Caroba: Dodó sente ciúme de Margarida, pois pensa que ela irá encontrar-se com Eudoro; Pinhão sente ciúme de Caroba quando sabe que ela irá em lugar de Margarida; Euricão desconfia que querem roubar sua porca recheada, pois ouve falarem em devorar porca e pensa ser a sua, quando é a do jantar que se encomendou para receber Eudoro; Pinhão desconfia de Eurico e o observa, porque este age estranhamente. Na hora do encontro entre Margarida e Eudoro, Caroba tranca Margarida no quarto, manda Benona permanecer também no seu e vai, vestida de Margarida, receber Eudoro. Dodó vê Caroba e pensa ver Margarida, pois está com o vestido dela. Para não ter que se explicar, Caroba o empurra e tranca no quarto com Margarida. Caroba então veste roupa de Benona e esta a de Margarida. Caroba então recebe Eudoro vestida de Benona. Ele é enganado: pensa estar conversando com a antiga noiva, que se insinua a ele, na penumbra não percebe que é Caroba. Ela o leva ao quarto de Benona e o tranca com a ex-noiva, por quem agora já está novamente interessado. Pinhão ao sair do esconderijo onde estivera observando a cena, vê Caroba e pensa ser Benona e tenta seduzí-la. Ela reage e bate em Pinhão e o manda esperar por Caroba, que tira as roupas de Benona e diz que acompanhou toda a cena, bate outra vez em Pinhão, mas na confusão começam a se beijar. Aí destrancam as portas dos quartos de Margarida e Dodó, Benona e Eudoro, e entram em outro. Dodó e Margarida saem do quarto e pensam ter sido surpreendidos por Eurico, que entra em casa dizendo estar perdido. Na verdade Eurico havia saído para enterrar sua porca recheada dentro do cemitério. A conversa entre Eurico e Dodó é engraçada, pois ambos se enganam: Dodó fala de Margarida, enquanto Eurico fala da porca que desapareceu. Eurico pensa que o rapaz lhe roubou a porca, já que este o traiu. No desespero, Eurico finalmente revela que a porca estava cheia de dinheiro guardado há tantos anos. Com os gritos da discussão, Pinhão e Caroba saem do quarto. Depois Eudoro e Benona do seu. A cena é divertida: são três casais que de repente estão juntos e felizes ante Euricão lamentando a perda da porca. Graças a Caroba os casais se entendem sem Euricão nem Eudoro perceberem o engano de que foram vitimas. Margarida desconfiou de Pinhão e afirmou que ele pegara a porca. Eurico lhe salta no pescoço e Pinhão acaba contando, mas exige vinte contos para dizer onde escondeu a porca, os vinte contos que Eurico conseguiu emprestados de Eudoro com a ajuda de Caroba. Com o vale do dinheiro na mão, mostra a porca que estava na casa mesmo. Então, Eudoro faz Eurico perceber que aquele dinheiro era velho e havia perdido o valor. Eurico se desespera. Tentam dissuadi-lo da importância do dinheiro, mas ele manda todos embora e fica só, com a porca e o Santo, tentando entender o que aconteceu, qual o sentido de tudo que houvera.

LIVRO: Incidente em Antares


Category: Books
Genre: Literature & Fiction
Author: Érico Veríssimo

SÍNTESE DO INCIDENTE EM ANTARES

Primeira parte: Antares

A bem dizer, Antares é uma cidadezinha perdida no mapa do Rio Grande do Sul, às margens do rio Uruguai, "na fronteira do Brasil com a Argentina". Essa cidadezinha será palco, em 1963, numa sexta-feira, de "um drama talvez inédito nos anais da espécie humana" (p. 3).

A origem de Antares remonta há muitos anos atrás, conforme reza um relato do naturalista francês Gaston Gontran, em seu livro Voyage Pittoresque au Sud du Brésil (1830-1831). Deslumbrado com a beleza do lugar, o naturalista mostra a seu hospedeiro, Francisco Vacariano a estrela Antares. "É um bonito nome para um povoado" (p. 6). E em 1853, quando o povoado é elevado à categoria de vila, Antares substituirá o nome primitivo "Povinho da Caveira". Para muitos, entretanto, Antares significava "lugar das antas" (p.9).

Senhor absoluto da cidadezinha até então, Chico Vacariano é ameaçado no seu reinado por Anacleto Campolargo, "criador de gado e homem de posses" (p.10), que passa a disputar com o pioneiro (Chivo Vacariano) o domínio daquele feudo. Há lutas de mortes e o ódio se estabelece entre os dois clãs por gerações sucessivas, com atos de violência e atrocidades inimagináveis. A rivalidade entre as duas dinastias durou "quase sete decênios, com períodos de maior ou menos intensidade" (p. 11).

A década de 20 trouxe para Antares muito progresso, tanto na ordem material como intelectual" (p. 29), e a cidade "até então um município exclusivamente agropastoril, começava auspiciosamente a industrializar-se. O telégrafo, o cinema, os jornais e revistas que vinham de fora, a estrada de ferro e, depois de 1925, o rádio - contribuíram decisivamente para aproximar o mundo de Antares ou vice-versa (p. 29).

A rivalidade, contudo, entre os dois clãs (Vacariano X Campolargo) domina a cidade a política local. Após um período de turbulência e atrocidades engendradas por Xisto Vacariano e Benjamin Campolargo, chega à cidade de Antares, com a missão de estabelecer a paz entre as duas famílias beligerantes, "um membro da prestigiosa família Vargas, de São Borja" (p. 33): era Getúlio Vargas, a essa época, deputado federal. Usando de artimanhas, Getúlio consegue aproximar os dois chefes políticos, ponderando: "Os amigos hão de concordar em que os tempos estão mudando. O mundo se encontra diante da porteira duma nova Era. Essas rivalidades entre maragatos e republicanos serão um dia coisas do passado. Precisamos pacificar definitivamente o Rio Grande para podermos enfrentar unidos o que vem por aí..." (p. 35).

Os dois velhos próceres, agora apaziguados serão substituídos por Zózimo Campolargo, casado com D. Quitéria (D. Quita) e Tibério Vacariano, casado com D. Briolanja (D. Lanja). De boa paz e meio indolente, Zózimo "era um homem sem nenhuma vocação para liderança" (p. 38). Dessa forma, a chefia política da cidade acaba sendo assumida por Tibério e D. Quita, "criatura enérgica e inteligente, senhora de razoáveis leituras, e até duma certa astúcia política" (p. 38). D. Quita, pois, diante da indolência do marido, acaba-se tornando a "eminência parda, o poder por trás do trono". Com o "tratado de paz" entre as duas famílias, engendrado por Getúlio, uma grande amizade é cultivava entre os dois casais.

Com a ascensão política de Getúlio Vargas, que inaugura o Estado Novo no Brasil, Tibério se estabelece no Rio de Janeiro e vai-se enriquecendo através de negociatas e atividades escusas. "Além de advocacia administrativa, ganhava dinheiro em transações imobiliárias e ocasionalmente no câmbio negro. A Segunda Guerra Mundial proporcionou-lhe oportunidades para bons negócios, uns lícitos, outros ilícitos. Habituara-se a viver à sócios, e para si mesmo. E, como tantos de seus pares, já possuía, num banco de Zurique, uma conta corrente numerada, cada vez mais gorda em dólares" (p. 48).

Com o fim do Estado Novo e a que da de Getúlio Vargas, incompatibiliza-se com ele e volta para Antares, onde vai consolidando o seu impérdio: atrai para a região uma empresa de óleos comestíveis de Mr. Chang Ling, a qual se alimentava da soja de sua produção: era a "Cia. De Óleos Sol do Pampa, da qual Tibério Vacariano possuía 500 ações que não lhe aviam custado um vintém" (p. 65). Por outro lado, dando vazão aos seus instintos de garanhão constitui outra família, envolvendo-se com a exuberante Cleo, que passa a ser sua "teúda e manteúda".

Após as marchas e contramarchas da política nacional, em que tem lugar o governo do Presidente Dutra, Getúlio Vargas retorna triunfante, em 1951, agora "nos braços do povo". É um período de turbulência política, em que a UDN de Carlos Lacerda combate tenazmente "o pai dos pobres". O atentado a Lacerda, em 1954, ao que tudo indica comandado por Gregório Fortunato (escudeiro do Presidente) precipita a queda de Getúlio, que tenta resistir: "Daqui só saio morto. Estou muito velho para ser desmoralizado e já não tenho razões para temer a morte" (p. 80).

O suicídio, a forma honrosa encontrada pelo Presidente para "sair da vida e entrar na História", desperta no país profunda comoção popular. Pressionado e abandonado, ao morrer, Getúlio escreveu: "À sanha de meus inimigos deixo o legado da minha morte. Levo o pesar de não ter podido fazer pelos humildes tudo aquilo que desejava". A sua carta-testamento, redigida em estilo grandiloqüente, confere grandeza à sua morte: "Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram o meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo na caminhada da eternidade e saio da vida para entrar na História" (p. 90).

Os acontecimentos políticos são acompanhadas com atenção em Antares: cada vez que a sirena de "A Verdade" (o jornal da cidade, de Lucas Faia) tocava, lá vinha notícia urgente e em primeira mão. Assim é que o povo de Antares vai acompanhando e discutindo (sobretudo a turma da Farmácia Imaculada Conceição) os acontecimentos políticos do cenário nacional: a eleição de JK e a posse tumultuada, o seu governo de prosperidade e progresso (cinqüenta anos em cinco), a construção de Brasília, a industrialização do país. É por essa ocasião que morre Zózimo, no Rio, onde fora transportado em busca de cura.

Candidato da UDN e a parte do PSD dissidente, Jânio Quadros, o candidato de Tibério Vacariano, vence as eleições e renuncia poucos meses depois, levado por "forças terríveis". Uma decepção para Tibério. A renúncia de Jânio mergulhou o país no caos e na incerteza, pois o Jango, o vice-presidente, de tendência socialista, não era bem visto pelos militares e as forças conservadoras. Tudo foi contornado com o artifício do parlamentarismo, que teria, contudo, vida curta.

Mergulhado na incerteza, com greves e agitações, com Brizola, fazendo barulho, o governo de João Goulart era um convite ao golpe, - o que não demorou a acontecer: era março de 1964.

Enquanto isso, Antares era objeto de uma radiografia: o Prof. Martim Francisco Terra e sua equipe escolheram exatamente Antares para realizar a sua "anatomia duma cidade gaúcha de fronteira". O objetivo da pesquisa como expõe o professor, era "saber que tipo de cidade é Antares, como vive a sul população, qual seu nível econômico, cultural e social, os seus hábitos, gostos, opiniões políticas, crenças religiosas" etc. (p. 128). Publicado em livro, o resultado da pesquisa revelou-se desastroso para a imagem da cidade, que esperava exatamente o contrário: Antares era uma cidade prosaica, com gente desconfiada e preconceituosa, com vícios de alimentação e um enorme problema social ao seu redor - a favela Babilônia, "um arraial de miséria e desesperança" (p. 138)

Incompatibilizando com a cidade, taxado de comunista, o Prof. Martim passa a ser "personna non grata" na cidade. Mais tarde, será perseguido pela Revolução de 1964 e tem que se exilar do país. Ao lado da "anatomia" de Antares, realizada pelos pesquisadores do Prof. Martim (inclusive Xisto, neto do coronel Tibério), as personagens gradas do livro são apresentadas através do diário do professor: o coronel Tibério, dono da cidade; D. Quitéria, matriarca dos Campolargos; Vivaldino Brazão, prefeito da cidade; Dr. Quintiliano do Vale, o meritíssimo juiz, o delegado truculento Inocêncio Pigarço; os médicos Dr. Lázaro (da família Vacariano) e Dr. Falkenburg (dos Campolargos); o jornalista Lucas Faia, de "A Verdade", com o cronista social Scorpio; Pe. Gerôncio, de linha tradicional, e o Pe. Pedro-Paulo, moderno, de linha socialista, taxado de comunista; o promotor Dr. Mirabeau; o fotógrafo de origem checa Yaroslav; o paranóico teuto-brasileiro Egon Sturm, neonazista; o maestro solitário Menandro de Olinda; o Prof. Libindo Olivares, com a sua fama de grande latinista, helenista, matemático e filósofo.

Segunda Parte: o incidente

Comandada por Geminiano Ramos, uma greve geral paralisa todas as atividades em Antares: reivindicando melhoria salarial, cruzam os braços os operários do Frigorífico Pan-Americano (de Mr. Jefferson Monroe III), da Cia. Franco Brasileira de Lãs (de M. Jean François Duplessis), da Cia. De Óleos Comestíveis Sol do Pampa (de Mr. Chang Ling) e também os encarregados da Usina Termo-elétrica Municipal, deixando a cidade às escuras. Era o dia 11 de dezembro de 1963, uma quarta-feira.

Por outro lado, nesse mesmo dia, vem a falecer a veneranda matriarca D. Quitéria (enfarte do miocárdio) e mais seis outras pessoas: Dr Cícero Branco (derrame cerebral), advogado das falcatruas do Cel. Tibério e do Prefeito Vivaldino; o anarco-sindicalista José Ruiz, vulgo Barcelona; o "subversivo" João Paz, torturado pelo delegado Inocêncio; o maestro Menandro, que suicidou, cortando os punhos; o bêbado Pudim de Cachaça, envenenado pela mulher; e a prostituta Erotildes, que morreu vitimada pela tuberculose, na ala dos indigentes do Hospital "Salvator Mundi", do Dr. Lázaro.

Irredutíveis na sua greve, os operários, com a solidariedade dos coveiros, interditam o cemitério e impedem o enterro, ficando insepultos os sete defuntos. E é aí que acontece o fantástico: os defuntos se erguem dos seus caixões e, após as apresentações, comandados pelo Dr. Cícero, arquitetam um plano, exigindo das autoridades o sepultamento a que tinham direito: "ou nos enterram dentro do prazo máximo de vinte e quatro horas ou nós ficaremos apodrecendo no coreto, o que será para Antares um enorme inconveniente do ponto de vista higiênico, estético... e moral, naturalmente" (p. 250). Dispostos em ordem hierárquica, os defuntos descem até o centro da cidade, provocando pânico e horror por onde passavam, e estabelecem o caos em Antares. Como ficara combinado, cada um poderia dispor do tempo como quisesse até ao meio-dia em ponto-horário do ultimato ao Prefeito.

D. Quitéria, numa visita aos genros e filhas, já exalando o mau cheiro do corpo em decomposição, assiste à discussão e brigas pelo seu espólio; o Dr. Cícero surpreende a esposa em flagrante adultério com um rapazinho louro, e depois dirige-se à casa do prefeito; Barcelona afugenta os policiais e dá uma lição no delegado Inocêncio Pigarço; Menandro toca enfim a "Apassionata" de Beethoven; Erotildes visita a amiga Rosinha que a recebe, na sua humilde, sem nenhum medo (certamente porque não tinha nada a temer...); Pudim de Cachaça vai ao encontro do velho amigo de bebida Alambique, que o recebe também sem medo (é comovente o amor que demonstra pela esposa que o envenenara); Joãozinho Paz inicialmente conversa com o Pe. Pedro-Paulo, na praça, e depois tem um encontro comovente com a esposa grávida (Ritinha).

Por outro lado, reunido com seus pares, o prefeito busca uma solução para o problema. Até mesmo o Pe. Pedro-Paulo é ouvido na reunião; depois se retira. Após muitas falações, em que o "sábio Prof Libindo tenta explicar o fenômeno como um caso de ‘alucinação coletiva' ", as opiniões se divergem: o delegado Inocêncio e o Cel. Tibério propõem uma solução violenta, pela força; os outros tendem para a parlamentação com os mortos - proposta que sai vitoriosa.

O encontro entre vivos e mortos se dá exatamente ao meio-dia, com a praça apinhada de gente, sob um sol escaldante. Tem lugar, então, um autêntico julgamento dos vivos, em que os mortos, através do seu advogado constituído, expõem os podres sobretudo das pessoas gradas da cidade: as falcatruas do Cel. Tibério e do Prefeito; a truculência do delegado Inocêncio; a pederastia e vaidade do Prof. Libindo; a caridade falsa do Dr. Lázaro; a magnanimidade hipócrita do Dr. Quintiliano. AO expor essas mazelas da fina sociedade antarense, o Dr. Cícero arrancava aplausos sobretudo dos estudantes que estavam pendurados nas árvores. Tomando a palavra, Barcelona, sem papas na língua, revela casos de adultério de damas insuspeitas e honradas de Antares. O mau cheiro (dos cadáveres em decomposição e sobretudo daquela sociedade podre) atrai urubus e, depois, Antares é invadida por ratos que empestam ainda mais a cidade.

Esse "fenômeno" provoca em Antares uma verdadeira revolução: Dr. Lázaro procura o Pe. Pedro-Paulo para fazer confidências; o Maj. Vivaldino tem que dar explicação à mulher; Dr. Mirabeau se preocupa por ter sido chamado de "fresco" e quer provar o contrário (por sinal, não consegue...); Dr. Quintiliano não consegue dominar mais Valentina, sua esposa, que se revela "pantera acoimada"; o delegado Inocêncio briga com o filho (Mauro), que se manda da cidade; Pe. Gerôncio balança a cabeça, perplexo. Enfim, a cidade de Antares foi sacudida nas suas entranhas com a presença mortos que apodreciam no coreto.
Conforme prometera a Joãozinho, o Pe. Pedro-Paulo transporta Ritinha para o outro lado do rio Uruguai (Argentina), onde estaria a salvo da truculência do delegado. É nessa oportunidade que fica sabendo do amor do Mendes, secretário subserviente do Prefeito, pela mulher de Joãozinho.
Atacados a pedradas e garrafadas pelos "embuçados da alvorada" (bando de Tranqüilino Almeida), os defuntos se rendem e voltam para os seus esquifes. Por outro lado, comandada por Germiniano, uma assembléia encerra a greve e os mortos são, enfim, enterrados.

Sepultados os mortos, um vento forte sobra sobre Antares e carrega o mau cheiro que empestava a cidade: aos poucos tudo vai voltado à normalidade e as pessoas vão retomando as suas máscaras. Dessa forma, quando o pessoal da imprensa de Porto Alegre chega a Antares para documentar o fenômeno, o prefeito nega tudo e inventa outra estória: tudo fora um artifício para promover a cidade. Em vão os jornalistas tentam entrevistar outras pessoas. Procurado, o Pe. Pedro-Paulo mostra-lhes a favela miserável da Babilônia.

Numa reunião convocada pelo Prefeito, o Prof Libindo propõe a "operação borracha", para desespero do Lucas Faia que escrevera um artigo brilhante sobre o "fenômeno". Coroada de êxito, a "operação borracha" se encerra com um grande banquete em que a sociedade antarense, apaziguada pelo tempo, repõe as suas velhas máscaras.

Retornando à cidade com Xisto, o Prof. Martim Francisco é ameaçado e aconselhado pelo velho Cel. Tibério e pelo Prefeito a sair da cidade. Na despedida, acompanhado pelos seus amigos Xisto e Pe. Pedro-Paulo, ele antevê a chegada da revolução de 64 que está na iminência de acontecer.

Enfim chega março de 1964 e a revolução se instala para ficar e reafirmar os valores da sociedade capitalista, empurrando para longe os anseios socialistas. Cada um vai seguindo o seu destino ou o destino que lhe foi imposto; uns morrem (Cel. Tibério, Pe. Gerôncio); alguns são promovidos (Delegado Inocêncio, o juiz Dr. Quintiliano); o Prefeito Maj. Vivaldino Brazão "entrou num período de hibernação política" e foi cuidar de suas orquídeas; outros foram perseguidos, pelo novo governo (Geminiano, Pe. Pedro-Paulo, Prof. Martim).

Em suma, a julgar pelas aparências, "Antares é hoje em dia uma comunidade próspera e feliz" (p. 484). Entretanto, uma criança que estava começando a aprender a ler, soletra uma palavra perigosa, pichada no muro: "LIBER--- Não terminou: em pânico, o pai arrasta-o e silencia-o com um safanão".

ORGANIZAÇÃO - ESTRUTURA - PERSONAGENS

1) Como se viu, Incidente em Antares vem dividido em duas partes.

Na primeira ("Antares"). "o leitor fica conhecendo a história dessa localidade, bem como as das duas oligarquias rivais que a dominaram política e economicamente por mais de cem anos. Trata-se, em suma, de uma espécie de apresentação do palco, do cenário, bem como das personagens principais e da numerosa comparsaria que, através de seus descendentes, serão envolvidos no dramático ‘incidente' da sexta-feira, 13 de dezembro de 1963." (contra-capa).

"A segunda parte, cuja duração é muito menor em tempo de calendário, embora ocupem ais espaço tipográfico, mostra o incidente propriamente dito e suas conseqüências" (contra-capa). Utilizando-se do fantástico como forma de expressão (a animização dos mortos insepultos), Érico Veríssimo revela, a decomposição social e moral da sociedade humana através do microcosmo enfocado (a cidade de Antares).

2) Os fatos são narrados em terceira pessoa por um narrado onisciente e onipresente.

Esse narrados, contudo, ao longo da narrativa, vai simulando transcrições de pseudo-autores, como o relato do naturalista francês Gaston Gontran d'Auberville (p. 3); a carta do Pe. Juan Bautista Otero (p. 7); os diários do Pe. Pedro-Paulo e do Prof. Martim Francisco Terra (na apresentação das personagens, por exemplo); os artigos de Lucas Faia no jornal "A Verdade"; e excertos do livro Anatomia duma cidade gaúcha de fronteira, organizado pelo Prof. Martim e sua equipe.

O autor, pois, utiliza-se de todos esses recursos para organizar a sua narrativa, dando, dessa forma, a impressão de que tudo aconteceu e é verdade.

3) Visto globalmente, Incidente em Antares é, sem dúvida, um romance.

A primeira parte, contudo, dada sua linearidade e sucessividade episódica, lembra a espécie literária que chamamos de novela: cerca de um século de história fui cronologicamente, antes de o autor se deter na sua análise, em profundidade, da sociedade antarense.

PERSONAGENS

As personagens de Incidente em Antares podem ser agrupadas de acordo com as suas convicções políticas e a sua condição social.

1) Representando a ordem social tradicional, marcadamente conservadora e aristocrática, os dois clãs rivais (Vacarianos e Campolargos) dominam a cidade. É em torno dessa aristocracia, em que predomina o sistema patriarcal, que se organizam as pessoas gradas de Antares, as quais forma e revelam-se podres e em adiantado estado de decomposição moral, exalando um mau cheiro pior que o dos mortos do coreto na praça nobre da cidade. Ao levantar a tampa do "caixão", retirando a máscara que envolvia cada um desses honrados cidadãos, Érico Veríssimo revela a podridão daquela sociedade carcomida nas suas entranhas. Como se viu pela síntese que fizemos, a verdade não convinha a esses aristocratas, e a solução foi lacrar os caixões e enterrar a verdade com os sete mortos.

2) As personagens femininas, com exceção de D. Quitéria, a matriarca dos Campolargos, vivem à sombra dos seus maridos, submissas e alienadas, aceitando passivamente a ordem estabelecida. Uma exceção a essa passividade e alienação é Valentina, mulher do Dr. Quintiliano. Influenciada por leitura perigosas e possivelmente pelo Pe. Pedro-Paulo, ela se rebela consciente e politizada, questionando o marido e não aceitando as imposições. Era, sem dúvida, um avanço naquela sociedade rigidamente patriarcal. Valentina, contudo, é ainda uma "pantera açaimada" (expressão do Prof. Martim) que não tem condições de se libertar plenamente.

3) As personagens esquerdistas, taxadas de comunistas naquela sociedade conservadora, defendem o socialismo e lutam por um ordem social mais justa e um mundo melhor. Evidentemente, esses progressistas chocam-se com os interesses da aristocracia dominante e são perseguidos. Entre outros, destacam-se aqui o Pe. Pedro-Paulo, o Prof. Martim, Joãozinho Paz com sua mulher (Ritinha), Geminiano ramos, Barcelona, o anarco-sindicalista, e mesmo Xisto, neto do Cel. Tibério.

4) Entre os humildes, constituindo a ralé da sociedade antarense, está o submundo da favela Babilônia. Nessa linha, incluem-se a prostituta Erotildes e o bêbado Pudim da Cachaça. Essas personagens, apesar de discriminadas e marginalizadas, revelam, na sua humilde e singeleza, uma grandeza comovente. Certamente por isso, não assustam os amigos visitados depois de mortos (Rosinha e Alambique).

5) Mais ou menos marginalizados, enclausurados, nos seus dramas pessoais e nos seus traumas, destacam-se o maestro Menandro, o neonazista Egon Sturm e certamente o subserviente secretário do Prefeito (o Mendes). Nessa lista, em falta de outro lugar, talvez possa entrar aqui também o fotógrafo checo Yaroslav.

ESTILO DA ÉPOCA

Publicado em 1971, Incidente em Antares se enquadra no estilo modernista não só pelas inúmeras referências e fatos e pessoas da época atual, como também pela presença de ingredientes que configuram, no livro, o gosto modernista.

1) A fundamentação na cultura nacional revela bem uma das tendências do Modernismo: a valorização de elementos folclóricos e tradicionais, bem como de costumes regionais, é uma das metas modernistas. Esse nacionalismo aparente, contudo, quase sempre esconde dramas existenciais que têm dimensão universal. No livro de Érico Veríssimo, Antares é, sem dúvida, um símbolo de um universo maior. Aliás, essa idéia aparece, numa conotação política, pichada nos muros da cidade: "A sociedade de Antares está podre. Antares é o símbolo da burguesia capitalista decadente" (p. 459).
2) Outro aspecto do livro que configura o Modernismo é o fantástico, que se manifesta em Incidente em Antares através dos sete defuntos insepultos. Embora autores não-modernistas tenham-se utilizado desse recurso também (Machado de Assis em Memórias Póstumas por exemplo), esse é um gosto mais freqüente do Modernismo. Esse truque evidentemente tem o seu sentido: é através do morto (fora, portanto, do palco da vida) que se vê melhor. Ficando fora do círculo da vida, desataviado da máscara e convenções sociais, é possível ver com maior nitidez e mais objetividade. A invasão dos ratos, sem dúvida é outro elemento bem ao gosto da literatura fantástica.

3) No que diz respeito à linguagem, são constantes os registros da fala coloquial, como é comum no Modernismo. Isso, sem dúvida, confere maior autenticidade à personagem.

"- Me prenda, coronel, me rebaixe de posto, mas uma coisa dessas eu não faço (p. 20).

- Ele vai acabar levando o Brasil pro lado de Moscou - Também fingi que não tinha visto ele e fiz meia volta (p. 75).

- Uma das meninas me telefonou ind'agorinha (p. 203). Fiel a esse registro da linguagem coloquial, muitas vezes aparece palavrão e pronúncias típicas do Rio Grande, além de regionalismos.

- Não hai bem que sempre dure nem mal que nunca se acabe. (p. 287).

- Desculpe lê tirar da cama a esta hora, governador (p. 192)

-Se algum filho da pota me fizer qualquer provocação, traço-lhe bala (p. 123).

4) Outro aspecto que se destaca no estilo modernista é a postura engajada assumida pelo autor em relação a problemas de ordem política ou social. Em Incidente em Antares, o autor denuncia não só as falcatruas e negociatas escusas, como também a truculência e atrocidades da polícia, que espanca e tortura em nome da ordem e da segurança social. O caso de Joãozinho Paz e sua mulher gráfica (Ritinha) é dos mais ilustrativos.

O autor modernista, pois, não é um alienado - participa ativamente dos problemas da sociedade em que vive, denunciando as arbitrariedades, desmandos e injustiças.

5) Atenda às novidades e ao progresso, na década de vinte, Antares toma conhecimento do movimento modernista através de versos de Mário e Oswald de Andrade que são receitados num sarau de arte por um forasteiro: "Num sarau de arte, no Solar dos Campolargos, um forasteiro recitou versos modernos - que ninguém entendeu - de Oswald e Mário de Andrade" (p. 30).

ESTILO DO AUTOR / LINGUAGEM

Ao longo da narrativa de Incidente em Antares, Érico Veríssimo revela algumas características estilísticas que configuram a sua maneira de escrever.

1) Como já observamos na "organização e estrutura", o escritor constrói a sua narrativa intercalando, no romance, textos de pseudo-autores. Essa simulação, em que Érico Veríssimo transcreve relatos, diários e artigos de jornais, imprime à narrativa uma atmosfera de verdade, dá a impressão de que a estória é verdadeira.

É claro que, ao lado da ficção, há fatos históricos, registrados por ele, que realmente aconteceram. Aliás, é o próprio autor quem observa numa "nota", logo no início do romance: "Neste romance as personagens e localidades imaginárias aparecem disfarçadas sob nomes fictícios, ao passo que as pessoas e os lugares que na realidade existem ou existiram, são designados pelos seus nomes verdadeiros."

Essa mistura de ficção e história (ou de estória com história) sempre foi uma das grandes características do estilo Érico Veríssimo).

2) Combinado com o sarcasmo e espírito critico que perpassa o livro, o autor revela-se irônico e mordaz ao longo do romance, caricaturando gente, linguagem e instituições. O Prof. Libindo, por exemplo, e outros eruditos da cidade sofrem sob a pena do escritor. Os discursos da palavras bonitas, os artigos de estilo grandiloqüente e pomposo (de Lucas Faia) vêm sempre perpassados de zombaria e sarcasmo. Veja bem a passagem abaixo, em que o sábio Prof. Libindo digladia verbalmente com o meritíssimo juiz Dr. Quintiliano, a propósito do lema dos "Legionários da Cruz", da D. Quita: "Meu caro magistrado, quem defende a Pátria defende precipuamente a Lei e a Ordem contidas ambas no vocábulo oceânico Pátria (...)". "Pois se a coisa é assim", retrucou o juiz, "bastaria então que no lema dos Legionários da Cruz se falasse apenas em Deus, pois a idéia de Deus, na sua universalidade incomensurável, abrande tudo: Ele próprio, as suas leis, a sua ordem cósmica e moral, a Pátria, a Família, a Humanidade". Ficava de fora a Propriedade, o que levou o Cel. Tibério a gritar: "E a prosperidade?" (p. 180).

Quase sempre com essa conotação irônica, vêm aí informações entre parênteses, como a que vamos transcrever que reproduz uma discussão entre os mortos, em que Dr. Cícero, ante a proposta de votação de Barcelona, diz: "- Não direi que aqui em cima estejamos numa democracia. Imaginemos que isto é uma... uma tanatocracia. (E os sociólogos do futuro terão de forçosamente reconhecer este novo tipo de regime)" (p. 250).

Assim, pois, combinando com a mordacidade que perpassa a obra, o autor ironiza e caricaturiza máscara da sociedade antarense na sua fala gongórica e vazia, na sua postura fingida e hipócrita. Só os humildes e sinceros escapam da "pena da galhofa" de Érico Veríssimo.

3) Outro aspecto que se destaca na linguagem do livro é a tendência do autor para criar tempos novos, quase sempre da formação erudita, com base nos radicais gregos e latinos. Além de "tanatocracia" (= morte+governo), que acabamos de ver no item anterior, veja-se ainda:

"- Vivemos numa cafajestocracia, isso é que é". (p. 94) (hibridismo: cafajeste+governo).

"- Democracia qual nada, governador! O que temos no Brasil é uma merdocracia" (p. 193) (hibridismo: merda+governo).

Além desses, chama a atenção também para as lições do Prof. Libindo que vai ensinando ao longo do romance:

"O Prof. Libindo me garante que a palavra orquídea vem do grego e significa testículo" (p. 158).

"O Prof. Libindo, num aparte forçado, pergunta se os presentes sabem que a palavra canícula significa na realidade ‘cadela' e que era o antigo nome da estrela Sírio" (p. 321).

Digno de nota também é o verbo "filho-da-putear", usado na página 79: "... depois de se filho-da-putearem abundantemente, estavam já de revólver na mão".

4) Além dessa erudição demonstrada (adquirida de forma autodidata, pois Érico Veríssimo não chegou à universidade, não tenho nem mesmo acabado o curso ginasial), o escritor entremeia a sua narrativa, sempre pela boca de suas personagens eruditas, de latim, francês, inglês e outras línguas.

5) Embora gaúcho, Érico Veríssimo usa com parcimônia vocábulos regionais. Uma ou outra palavra trai o regionalismo gaúcho, como a pronúncia de pronome "lhe" (=lê), o uso de formas que lembram o espanhol, como "Bueno" (p. 200) e "personalmente" (p. 201) e a pronúncia com "e" e "o" do Cel. Tibério, quando usa o palavrão "filho-da-puta": "Felhos da pota" (p. 204).

ASPECTOS TEMÁTICOS MARCANTES

São muitos os aspectos temáticos que podem ser detectados no romance Incidente em Antares:

1) De conotação política, destacam-se no romance, entre outros, os seguintes aspectos:

a) Érico Veríssimo tece no livro um verdadeiro painel sócio-político, não só no Rio Grande do Sul como do país. Como vimos, o seu mapeamento abrange mais de cem anos e, através dele, pode-se acompanhar as marchas e contramarchas da política nacional. Sobretudo na primeira parte, a impressão que se tem é de que o autor faz mais história do que ficção.

b) Nesse contexto político, além de outros, sobressai a figura de Getúlio Vargas com seu carisma, com seu nacionalismo, com o seu populismo e mesmo com seu fascismo. Com a sua auréola de "pai dos pobres", chega a ser impiedosamente ironizado por Tibério, quando do seu suicídio, ao ser inquirido por sua empregada sobre o que seria dos pobres: "- Os pobres vão continuar tão pobres como no tempo em que ele estava vivo" (p. 85).

Mas, apesar da frase de Tibério, dita com "perverso despeito", Getúlio tornou-se um mito para as pessoas simples e humildes, como a preta Acácia, que adorava o pai dos pobres "como se ele fosse um santo" (p. 301). Chega a fazer oração a ele por um melhor salário: "Meu ganhame aqui é pouco e o trabalho muito, Presidente. Mande essa gente me pagarem mais. Amém!" (p. 302).

c) Não obstante, entre os protegidos de Getúlio, a corrupção alastrava com negociatas escusas (contrabandos) e negócios ilícitos. Muitos, como Tibério Vacariano, enriqueceram-se e matinham contas numeradas em bancos da Suíça, favorecidos por negócios falcatruosos e empréstimos com fundo perdido no Banco do Brasil.

Numa conversa em casa dos Campolargos, por exemplo, o Tibério faz esta denúncia: "Em matéria de dinheiro o Getúlio é um homem honesto. Mas finge que não vê certas safadezas que se fazem ao seu redor. A sua técnica é a de corromper para governar. E nunca se roubou tanto, nunca se fez tanta negociata à sombra de Getúlio e em nome dele como neste seu atual quatriênio" (p. 74). Mas o Tibério era suspeito para falar, como pensava com seus botões a D. Quitéria: "Olhem só quem está falando em negociatas" (ib. id.).

d) Priorizando a política desenvolvimentista e a industrialização, vão-se instalando no país (período sobretudo de JK) as multinacionais e, com elas, a espoliação do país e a exploração do proletariado, como revela muito bem a fala humilde da negra Acácia (item b) na sua oração ao Presidente Vargas: "Meu ganhame aqui é pouco e o trabalho muito, Presidente".

A greve geral decretada pelos operários das multinacionais de Antares é uma resposta dos trabalhadores à exploração e ao salário da miséria que recebiam para enriquecer os abastados. A fala de Geminiano, líder dos grevistas, numa reunião com os patrões e o prefeito revela exatamente isto: "reivindicações salariais". (p. 200).

e) Combatendo o modelo capitalista, socialmente injusto e perverso, vão-se proliferando os esquerdistas, simpatizantes do socialismo, que se identificam com os pobres e operários e por isso taxados de comunistas e vermelhos. O momento político (de Jango e Brizola) favorecia a esquerdização e os "subversivos" iam-se proliferando, para desespero da sociedade capitalista e conservadora que não aceitava mudanças e reprimia o movimento.

Como observa o Pe. Pedro-Paulo ao Pe. Gerôncio, numa conversa, "comunista é o pseudônimo que os conservadores, os conformistas e os saudosistas do fascismo inventaram para designar simplisticamente todo o sujeito que clama e luta por justiça social" (p. 384). Numa outra passagem, esse mesmo padre lembrou ao delegado Inocêncio a postura "rebelde" de Cristo em face das arbitrariedades impetradas pela sociedade da época, dominada pelo império romano, e desafia o delegado torturador de Joãozinho Paz: "- Prenda Jesus, delegado, prenda-o o quanto antes! Interrogue-º Faça-o confessar tudo, dizer o nome de todos os seus discípulos e cúmplices... Se ele não falar, torture-o em nome da Civilização Cristão Ocidental!" (p. 321).

f) Diante do perigo "comunista" ameaçada na sua ordem secular, a caça às bruxas é uma conseqüência lógica, engendrada e executada pela sociedade conservadora e capitalista. A punição através da tortura e mesmo a morte, no sentido de reprimir esse clamor que exige justiça e liberdade, é antigo milenar. Basta lembrar Cristo crucificado ou, em nosso caso, o Tiradentes do Romanceiro de Cecília de Meireles.

Joãozinho Paz, sem dúvida, é aqui o bode expiatório, executado pela sanha do delegado Inocêncio Pigarço, em nome da ordem e da segurança da classe dominante. Conforme vem registrado no diário do Pe. Pedro-Paulo, "Joãozinho foi torturado barbaramente. Seu rosto está quase irreconhecível. Um braço e uma perna partidos" (p. 295). Por outro lado, detalhes da tortura vêm denunciados pelo morto Dr. Cícero, voz insuspeita do além-túmulo, no julgamento da praça nobre de Antares: "Vêm então a fase requintada. Enfiam-lhe um fio de cobre na uretra e outro no ânus e aplicam-lhe choques elétricos. O prisioneiro desmaia de dor. Metem-lhe a cabeça num balde d'água gelada e, uma hora depois, quando ele está de novo em condições de entender o que lhe dizem e de falar, os choques elétricos são repetidos..." (p. 369).

Como observou o Barcelona, do além-túmulo, "o delegado Inocêncio tinha aproveitado bem a sua ‘bolsa de estudos' com a polícia do Estado Novo" (p. 254).

2) Numa divisão meramente didática, destacava-se também no romance a análise da sociedade antarense, que tem obviamente conotação simbólica, objetivo esse empreendido e executado com maestria pelo escritor:

a) A sociedade enfocada no livro, como se tem mostrado, caracteriza-se pelo conservadorismo, apegada às aparências e fachadas, coisa de suas tradições e costumes seculares. Através da pesquisa organizada pelo Prof. Martim e sua equipe, Érico Veríssimo faz uma verdadeira anatomia da sociedade local, que é também, no fundo, o retrato de tantas outras.

Conforme registra Prof. Martim no seu diário, o juiz Quintiliano é bem um símbolo dessa "sociedade simétrica, policiada, regida por leis inflexíveis e imutáveis, cada coisa no seu lugar (e quem determina o ‘lugar exato' é a tradição, e tradição para ele é algo que tem a ver com seus ancestrais - pai, avô, bisavô, trisavô, etc). Está sempre, notei, do lado do oficial, do consagrado, do legal" (p. 417)

b) Organizada pelo macho, impera na sociedade antarense o sistema patriarcal e machista, em que o poder é exercido pelo homem, de forma despótica e absoluta. Sua vontade é a lei, o seu querer tem que ser respeitado, a sua voz tem que ser ouvida. O Cel. Tibério é certamente o grande senhor patriarcal do livro. Sempre armado, o coronel tinha o hábito de resolver tudo a bala. Até mesmo no caso dos mortos, a sua sugestão, bem como a do delegado, era de fazer os mortos retornarem ao cemitério, à força.

c) Posta nesse contexto, a mulher vive à sombra do macho, em tudo submissa, passiva e subserviente, aceitando a ordem estabelecida. Poucas reagem contra essa ordem em que fazem o papel de "matrona romana". Como já observamos, o exemplo de Valentina, com seu gesto de rebeldia, é uma tentativa ainda tímida de ruptura na ordem machista. Outro exemplo é a hatiana Dominique, mulher de M. Duplessis, a qual costumava "aprontar" nos rituais vudu.

Entretanto, integrada no "baile de máscaras" da sociedade, como diz Dr. Quintiliano a Valentina, é importante, para a mulher parecer honesta: - "Valentina, não basta a uma mulher ser honesta. É preciso também parecer" (p. 429)

d) Organizada assim - valorizando as aparências e fachadas - está claro que pobres e humildes serão objeto de discriminação e desprezo. Aqui entram as prostituas, bêbados, a favela Babilônia, os loucos e desafortunados da sorte; aqui entram até mesmo os "subversivos", como Pe. Pedro-Paulo, sempre mal visto e rejeitado pela sociedade; e também entram aqui os infelizes e solitários - os que sofrem de amor, como o Mendes, e os que sofreram trauma da frustração da derrota, como o maestro Menandro. Isso é o inferno - o inferno estava em Antares sob a forma do preconceito, e do desprezo, conforme dizia a D. Quita, no além-túmulo:

"- D. Quitéria, eu tive em Antares uma amostra do inferno. A incompreensão, o sarcasmo, a impiedade dos antarenses me doíam fundo. O inferno não pode ser pior que Antares" (p. 246).

e) Convivendo com essa podridão, conivente muitas vezes com falcatruas e arbitrariedades, parada no tempo, a igreja de Pe. Gerôncio ia rezando suas missas em latim, encomendando os seus defuntos à espera do Juízo Final, acomodada e fiel as tradições milenares, insensível aos problemas sociais e às vozes que clamam por justiça.

Esta é a imagem da religião tradicional, moldada à imagem e semelhança da sociedade aristocrática de Antares. A ela se contrapõe a igreja de Cristo, voltada para os pobres e miseráveis da vida; no lugar das rezas convencionais e da liturgia teatral dos milênios, surge o clamor de vozes que buscam a justiça e a libertação das garras do inferno, - inferno que é a vida degradante de milhões de miseráveis que jazem à margem de Antares.

Identificada com os pobres, chamando por justiça social, combatendo a truculência e as arbitrariedades humanas, esta é a igreja de Cristo, como diz o Pe. Pedro-Paulo ao Pe. Gerôncio:

"- Padre, enquanto Deus não nos disser claramente o que Ele pensa de tudo isso, nós devíamos em nome de Cristo, que era e é deste mundo, combater tipos como Inocêncio Pigarço, que matam em nome da Justiça, do Capitalismo, do Comunismo, do Fascismo, da Família, da Pátria e (não ria!) até mesmo de Deus".

f) Em suma, nesse grande painel que é Incidente de Antares, Érico Veríssimo se revela imparcial, acima de ideologias e faz uma crítica contundente e mordaz à sociedade. Através do truque utilizado, em que os mortos insepultos exigem o sepultamento, ele expõe os podres daquela sociedade em decomposição, hipócrita e carcomida nas suas entranhas. Os mortos insepultos e o mau cheiro exalado, sem dúvida, constituem um símbolo e revelam bem a decomposição moral da sociedade. Nada escapa à crítica do escritor. Ao erguer a tampa do caixão, ele destila o fel da sua mordacidade e desmascara a nata da sociedade antarense: nada escapa - nem a direita nem a esquerda; nem mesmo a medicina com sua falsa filantropia; nem muito menos a imprensa que com sua bisbilhotice; nem muito menos Rotary e o Lions com seu espírito fraternal; não escapam muito menos os doutores e professores com sua fala erudita e gongórica; também as senhoras honradas e impolutas são devassadas nos seus segredos de alcovas, flagradas em delitos de cama; nem mesmo o venerado ancião da estátua, exemplo-mor para descendentes e ascendentes, escapa à devassa realizada pelo escritor.

Entretanto, com o sepultamento dos mortos, a verdade também foi encerrada e a mentira, vitoriosa e triunfante, retoma o seu lugar no baile dos mascarados e na estátua da praça nobre da cidade.

CONCLUSÃO

É impossível ler um livro como Incidente em Antares e não se sentir assustado, não com os mortos que descem para a cidade, mas com a mentira que jaz subjacente em cada um de nós. É impossível ler um livro como este e não mexer, no sentido de combater e extirpar, da face da terra, a truculência e a mentira. É impossível sair da leitura deste livro insensível à causa do Pe. Pedro-Paulo e de Joãozinho Paz, em busca da justiça e do amor. É impossível ler este livro e sair dele sem se emocionar com o drama comovente de Joãozinho Paz e seu amor à vida, como diz ao Pe. Pedro-Paulo.

"Eu quisera acreditar em Deus e na vida eterna. Mas não posso. Nunca pude. Mas acredito na vida. E como! Tenho esperança num futuro melhor para nossa terra, para o mundo. Quero que meu filho nasça, cresça e viva para participar desse mundo" (p. 294)

Redimido pela leitura de Incidente em Antares, o filho de Joãozinho Paz crescerá nas nossas entranhas. Viverá e frutificará. Salvará o mundo da truculência e da mentira.

Que fique também, em cada um de nós, a lição do Pe. Pedro-Paulo com seu amor à vida e a sua luta em favor do Império do Amor:

"- Padre, espero não estar pecando quando sinta a alegria de estar vivo. Gosto da vida. É um desafio permanente. Se ela é absurda, sem sentido, então procuremos dar-lhe um sentido. Eu acho que a senha é o Amor" (p. 338).

Sem dúvida, é possível fazer tudo isso. Existe em cada um de nós um "menino do dedo verde" - capaz de amar e transformar o mundo. O ser humano não é o que parece, como dizia um tropeiro ao Pe. Pedro-Paulo (p. 439): "Olhe, moço, ninguém é o que parece. Nem Deus".

Oxalá este livro possa provocar em cada um de nós o incidente do Amor e nos despertar para a Beleza da vida! (p. 73).